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'Slow medicine' quer resgatar o tempo dedicado ao paciente

Pense nos princípios que deveriam reger a prática médica. Para começar, dedicar tempo para ouvir o paciente, refletir e tomar decisões. Buscar decisões compartilhadas levando em conta os valores, expectativas e preferências daquele indivíduo. Ter como objetivo a qualidade de vida da pessoa, com a perspectiva de que fazer mais nem sempre significa fazer melhor – portanto, quando a tecnologia não oferece as respostas, deve se considerar também a arte médica de não intervir. Essa abordagem está tão em falta que profissionais de diferentes países se uniram em torno da filosofia conhecida como slow medicine, que deve ser traduzida como medicina sem pressa.

Os dez princípios da slow medicine incluem os citados acima e podem ser conferidos no site do grupo de médicos brasileiros que integram esse movimento que teve origem na Itália, em 2002. Um dos participantes é o geriatra José Carlos Aquino de Campos Velho, que explica: “nossa proposta é resgatar o tempo como parte essencial da abordagem médica.

A slow medicine começa pela escuta cuidadosa e respeitosa, sempre enfatizando o raciocínio clínico e o cuidado focado no paciente. Acreditamos que só assim conseguimos construir um relacionamento sólido, de laços duradouros”.

Conhecer o paciente é o primeiro passo para chegar à escolha mais acertada (em inglês, “choosing wisely”). “Trata-se do cuidado apropriado”, diz o doutor José Carlos, “que pode, inclusive, ir na direção contrária de uma sucessão de exames e do uso intensivo da tecnologia. Hoje em dia, esse uso excessivo de procedimentos pode até gerar uma expectativa irreal dos pacientes e da família. Já há sociedades de especialidades médicas preocupadas com os excessos e listando procedimentos que não deveriam ser feitos rotineiramente”.

É uma triste constatação, mas a maioria das pessoas está tão condicionada a esse tipo de abordagem que não concebe uma consulta médica que não termine com prescrição de remédios e pedidos de exames. Numa saudável contramão, a slow medicine prega a medicina integrativa: além de utilizar os recursos tradicionais, não dispensa a medicina complementar, que inclui acupuntura e fitoterapia, entre outras alternativas. “É fundamental focar na manutenção da qualidade de vida”, afirma, lembrando que uma das preocupações do movimento é evitar a iatrogenia, que se caracteriza justamente como um quadro de complicações resultante do tratamento médico – como, por exemplo, quando a combinação de diferentes medicamentos causa efeitos adversos. “Muitas vezes, a desprescrição é o papel do geriatra, que deve tentar uma abordagem não farmacológica das doenças”, completa.

Num panorama no qual grandes corporações hospitalares se aproximam cada vez mais do mundo corporativo, onde pacientes viram clientes e médicos provedores de saúde, um movimento que prega a humanização desse serviço soa como bálsamo. No segundo semestre de 2019 haverá o segundo encontro brasileiro de slow medicine, em Petrópolis, no Rio de Janeiro, depois de evento realizado em 2017 em São Paulo. O formato final será discutido em novembro, mas deverá ter dois dias de duração e será aberto ao público.

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